A influência do progresso na vida infantil. [Tony Casanova]


Quando lembro da década de 70 me vem à mente as crianças brincando. Como tudo era tão diferente, desde a maneira como se educava as crianças até os brinquedos que elas utilizavam. As ruas tinham menos trânsito e muitas não estavam com pavimentação asfáltica ou mesmo de paralelepípedos, assim era possível jogar de bola nas ruas. Lembro-me que colocávamos duas latinhas cheias de terra para fazer a marcação das traves e formávamos times com quatro ou seis amigos de cada lado. Ali se passavam nossas manhãs ou tardes, sempre após a escola e nos finais de semana, a pelada era a atração entre a garotada. O futebol era um esporte típico de meninos na época e as meninas brincavam de cola-descola, pimbarra ou de cozinhar.
Era algo parecido com o que descreve o magnífico e genial Mauricio de Sousa com seus personagens Mônica, Cascão, Magali e Cebolinha, crianças que brincavam e estudavam com a mesma intensidade. As características foram habilmente transportadas aos personagens e eles arremetem à infância aqueles que viveram nas décadas de 70 e 80. Nesta época as crianças podiam estar nas ruas e tinham liberdade para brincar, correr, divertir-se de modo geral. A tecnologia ainda não possuía força para “prender” as crianças em casa sob a influência de novos brinquedos e jogos. Se hoje nossas crianças não desgrudam de um celular conectado a uma rede social, outrora nosso divertimento eram os gibis, as figurinhas, as brincadeiras coletivas.
Na minha concepção hoje é fácil perceber o quanto éramos submetidos à matemática enquanto brincávamos. Se observarmos atentamente veremos que durante um jogo de bolas de gude, por exemplo, tínhamos que por uma quantidade de bolas dentro de um triângulo riscado no chão e cada vez tínhamos que contar as bolinhas, não só as do triângulo como as que restavam nos bolsos ou no saquinho. O desenho do triângulo, uma figura geométrica. Os círculos que traçávamos, as linhas, a contagem dos amigos que participavam, tudo era ensinamento prático dentro das atividades que participávamos. Brincar não era só divertido, mas educativo também. Lógico sem falar nas atividades físicas contida nas brincadeiras de cola-descola, pimbarra ou soldado pega o ladrão.
Talvez o melhor de todas estas brincadeiras seja mesmo a expressão da liberdade estampada no sorriso de cada criança ao encontrar-se com outros colegas. A sociabilidade, a interação, a troca de experiências, enfim para os pais, na época, tudo era brincadeira, mas hoje eu percebo o quanto eram sérias aquelas oportunidades de ser feliz. Cada vez que ali nos reuníamos ali, muitas vezes pela manhã, à tarde ou mesmo pela noite, era aquela festa, uma explosão de alegria. A criança não era submetida a pesadas cargas de deveres de casa, cada pai instruía seus filhos a terem um horário previamente combinado para fazerem o dever e nos quais eles auxiliavam. Mudaram as rotinas de diversão, de trabalho da família, onde pai e mãe se obrigam a trabalhar para manterem em dia as contas domésticas e as crianças ficaram resumidas ás brincadeiras coletivas de escola, quando não estão grudadas em seus smartphones conectadas em redes sociais.
Já não temos mais ruas para nossas crianças brincarem, restam pequenas e inseguras praças repletas de malfeitores na espreita dos nossos filhos. Os espaços coletivos são disputados na Lei do mais forte. Já não temos o pião girando e as enfieiras nos dedos, os carrinhos de lata de óleo, os de madeira com rodas de pau, os bate-bates feitos de vasilhames de água sanitária ou os carrinhos de pneus velhos com cabos de vassouras atravessados. O convívio social resume-se ás redes sociais e as brincadeiras muitas vezes são bullying cibernético ou tentativas de aliciação de nossas crianças. Nada de correr, hoje o maior lazer coletivo é a praia seguida do cinema no shopping ou uma ida ao pesque-pague, se houver. Imaginar que ganhamos com tudo isso é esquecer de tudo que já tivemos na infância e que hoje já não temos para oferecer ás nossas crianças.

Texto do Escritor brasileiro Tony Casanova – Direitos Autorais reservados ao autor. Proibida a cópia, colagem, reprodução de qualquer espécie ou divulgação em qualquer meio, do todo ou parte dele, sem autorização expressa do autor sob pena de infração ás Leis Brasileiras e Internacionais de Proteção aos Direitos de Propriedade Intelectual. O uso da presente obra sem respeito aos créditos devidos ao autor incorrem em Crime de Plágio.

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